A Comuna El Maizal fica na porta de entrada da região venezuelana de Llanos, entre os estados de Lara e Portuguesa. É uma das comunas mais consolidadas da Venezuela, com cerca de 3.500 famílias vivendo em seu território; vastas extensões de terra dedicadas ao milho e ao gado; e uma série de projetos produtivos.
Ángel Prado é o principal porta-voz da comuna. Há dois anos, ele venceu uma difícil batalha para se tornar prefeito de Simón Planas, município que abrange a maior parte de El Maizal, juntamente com outras 11 comunas. Nesta entrevista, Prado discute seus esforços para conjugar o poder constituído com o projeto de longa data de desenvolvimento do poder comunitário.
Chris Gilbert / Cira Pascual Marquina: Alguns de nossos leitores certamente conhecem El Maizal, mas você poderia apresentar uma visão geral da comuna?
Ángel Prado” El Maizal é uma soma de experiências, treinos, vitórias e derrotas. No entanto, é antes de tudo um programa e um projeto que nos foi legado por Chávez, um programa que molda quem somos e como nos organizamos.
El Maizal encarna o modo de vida comunitário, que se baseia na procura de métodos inovadores e abordagens políticas para criar um mundo melhor. É claro que esta nova forma de viver não se define pela lógica do capital, mas sim por colocar o que há em comum e garantir dignidade para todos.
El Maizal reúne 27 conselhos comunais e 2.335 hectares de terras comunais. Além disso, conseguiu vincular o seu trabalho ao das outras comunas de Simón Planas e ao da União Communard, que é uma organização nacional composta por mais de 50 comunas. Tudo isto é muito importante porque, como disse uma vez Chávez, as comunas não podem permanecer isoladas; se o fizerem, serão devorados pelo sistema hegemónico, que é capitalista.
Acredito que El Maizal contribui significativamente para a nossa sociedade e para a nossa classe, porque segue o roteiro de Chávez. É por isso que a nossa comuna – como muitas outras – serve como um farol, um exemplo que inspira organizações populares em todo o país e até em todo o mundo.
CG/CPM: As comunas são mais do que apenas entidades políticas; representam um modelo económico emergente baseado em novas relações sociais. Você poderia elaborar isso?
APLICATIVO: A batalha contra o capitalismo ocorre em grande escala; trata-se de desmantelar as normas existentes, especialmente no que diz respeito à propriedade. É por isso que a propriedade colectiva da propriedade, a colectivização do trabalho e, claro, a distribuição comunal dos excedentes são tão importantes.
O nosso objectivo final é estabelecer uma cultura de propriedade comunal que contrarie o individualismo promovido pelo capitalismo. Nosso objetivo é reunir as pessoas, organizar-se dentro e para a comunidade e proteger os nossos meios de produção, ao mesmo tempo que avançamos em direção à industrialização e à distribuição direta. Em última análise, pretendemos controlar todo o ciclo de produção.
Actualmente, porque somos produtores primários, o excedente da nossa produção comunitária é muitas vezes capturado pelo mercado capitalista. Este é um problema sério, que sublinha a importância da industrialização comunitária.
O que estou dizendo não é verdade apenas para a comuna de El Maizal: todas as comunas precisam se industrializar. Não o fazer significa ter uma economia de sobrevivência na periferia do sistema capitalista existente.
CG/CPM: Após a queda da União Soviética, grande parte da esquerda global deu as costas ao poder estatal. Indiscutivelmente, Chávez desempenhou um papel crucial no reposicionamento do conceito de “tomar o poder” no discurso da esquerda.
Em Simón Planas, o movimento comunal procurou firmar-se num espaço de poder institucional constituído: a Câmara Municipal. Fê-lo apoiando a sua bem sucedida campanha para se tornar presidente da Câmara. Por que era importante controlar essa instituição?
APLICATIVO: Como chavistas e comunas, pretendemos controlar os recursos existentes e colocá-los ao serviço do povo. No nosso caso, isso significa assumir o controle dos meios de produção e das instituições públicas do nosso município.
El Maizal tem uma longa história de comunalização de terras devolutas e meios de produção, mas mais recentemente conseguimos assumir o controlo do Gabinete do Presidente da Câmara através da participação nas eleições. Tal como Chávez, não nos esquivamos de tais disputas.
Dependendo de quem o controla, um governo local pode ajudar ou dificultar o progresso em direcção aos objectivos comunitários e nós trabalhamos arduamente para conseguir o primeiro. Seguindo Chávez, acreditamos na disputa activa do poder: tomá-lo e colocá-lo ao serviço do povo. Sem a ascensão de Chávez ao poder político, a comuna não teria ganhado força. A sua liderança foi fundamental para promover o projecto socialista e reavivar as discussões sobre a utopia que perseguimos.
Claro, é importante não ser devorado pelo poder; em vez disso, deveria servir ao povo. No nosso país, quando exercido de forma revolucionária, o poder do Estado pode tornar-se um catalisador para o avanço da comuna.
CG/CPM: Chávez destacou repetidamente que a Venezuela ainda tem um Estado essencialmente burguês. O seu objectivo como presidente da Câmara não é fortalecer o Estado burguês, mas criar condições para a sua dissolução. Quais são os perigos e oportunidades, para você, como comunardo, ao se envolver na política em nível estadual?
APLICATIVO: Mesmo quando Chávez era vivo, houve uma campanha dentro do Estado para desacreditar o modelo comunal, retratando-o como ultrapassado, mal sucedido ou ineficiente. Essas noções persistem. É por isso que vemos a nossa participação no governo local como uma oportunidade para mostrar que os communards podem gerir instituições com competência.
Inicialmente, enfrentámos muitos desafios devido ao cepticismo generalizado. Porém, demonstramos que com determinação política, adesão a princípios e um objetivo claro podemos administrar com eficiência o aparato do governo municipal, colocando-o a serviço do povo. Vemos isso como uma ferramenta, mas o verdadeiro catalisador da transformação social é o movimento comunitário.
No entanto, existem armadilhas e perigos potenciais. Se interpretássemos a Câmara Municipal como o ponto focal da política, estaríamos falhando como revolucionários e chavistas, pois estaríamos abandonando o que deveria ser o núcleo da nossa vida política e económica: a comuna.
CG/CPM: Sua gestão como prefeito de Simón Planas se mostrou altamente eficaz. As instituições municipais resolveram vários problemas de infraestrutura, saúde e educação. Embora estas conquistas sejam louváveis, como contribuem para o objectivo estratégico do socialismo comunal?
APLICATIVO: Desde a Prefeitura promovemos ativamente debates, referendos e processos de tomada de decisões coletivas. Por outras palavras, a consulta é parte integrante da nossa forma de governação, que deveria ser cada vez mais comunitária.
Por exemplo, há um ano, organizámos um referendo sobre o orçamento participativo. O objectivo principal era eliminar leis municipais obsoletas que estavam em vigor há mais de duas décadas, dificultando a nossa capacidade de orçamentar, legislar e governar em colaboração com o povo. O referendo tinha vários objectivos específicos: queríamos reafectar fundos outrora controlados por altos funcionários para obras públicas e queríamos abrir processos cruciais de tomada de decisão ao povoado.
O referendo foi um sucesso. Houve uma elevada participação e isso abriu caminho para um novo modelo de governação em que os recursos, a informação e a tomada de decisões já não estão nas mãos de um grupo seleto. Agora a comunidade participa na direcção política e económica de Simón Planas, fortalecendo assim a organização comunitária.
CG/CPM: Alguns dos camaradas com quem falámos aqui dizem que o “governo comunal” deveria eventualmente substituir o Gabinete do Presidente da Câmara. Mas o que é exactamente um “governo comunitário” nesse contexto?
APLICATIVO: Essencialmente, um governo comunal é o governo do povo e para o povo. Materializa-se quando a comunidade decide colectivamente o que deve ser feito e participa activamente no seu planeamento e execução. Um governo comunal opera com autonomia, soberania e liberdade para tomar decisões sem restrições institucionais.
Inspirados na visão de Chávez, o nosso objectivo é dissolver instituições antigas, como o governo municipal, e substituí-las por espaços autónomos totalmente comprometidos com a comunalização da sociedade.
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Fonte: mronline.org