A jornalista Anabel Pomar, integrante do coletivo Exaltación Salud, disse isso durante sua passagem pelo programa Estás Muteadx. Lá ele falou sobre o uso de pesticidas na Argentina e especificamente em Exaltación de la Cruz, província de Buenos Aires. Pomar referiu-se ainda à detenção que sofreu a 11 de janeiro junto com outros membros do grupo, quando se manifestavam num evento onde participava o Presidente da Nação, Alberto Fernández.

Foto: Exaltação Saúde.

Entrevista: Pedro Ramírez Otero/Julián Bouvier. Redação: Julián Bouvier. Edição: Pedro Ramírez Otero.

A cidade de Exaltación de la Cruz, na província de Buenos Aires, se organiza há anos contra as fumigações. Famílias relatam casos de câncer devido a esses agrotóxicos. Em 11 de janeiro, o Presidente da Nação, Alberto Fernández, visitou Los Cardales como parte da inauguração de um centro de saúde. Lá, três membros do coletivo Exaltación Salud vieram se manifestar pacificamente, com uma faixa que dizia: “Basta de câncer, parem de nos fumigar”. A reação foi imediata. Repressão e detenção ilegal dos três porta-bandeiras. “Essa é a mensagem que queremos passar, aquela que eles não queriam ver. Vieram inaugurar um Centro Modular de Saúde e alargaram-no a toda a comunidade. Parecia-nos pertinente que se iam inaugurar um posto de saúde, iam falar de saúde numa cidade fumigada, tinham que ver a nossa reivindicação. Éramos apenas três companheiros. Dois para segurar a bandeira e um para tirar fotos e filmar. Não queríamos interromper o ato ou entrar gritando ou insultando. Estávamos cercados por muitos policiais à paisana. Quando tentamos exibir a bandeira, eles nos atacaram com grande violência para arrancar a bandeira. Estamos em uma democracia, é nosso direito se manifestar. Eles não entenderam assim”, disse a jornalista Anabel Pomar, integrante do Exaltación Salud e uma das detidas.

Alberto Fernández, em seu discurso na inauguração, falou sobre valores, respeito e que é preciso gritar. Tudo isso, em referência ao que aconteceu com as pessoas que se manifestaram. “Mas os gritos foram causados ​​por ações de segurança. Vimos que nosso parceiro que estava filmando foi espancado e queriam levar o celular dele. Começamos a nos retirar e vemos que mais policiais se aproximam, celulares de Buenos Aires. Eles nos pararam. Apareceu o jornalista Sebastián Vargas da FM Los Cardales e, em vez de ficar no local, como todos os outros jornalistas faziam, veio ver o que estava acontecendo conosco. Eles bateram nele, levaram o celular dele. E eles nos disseram que tinham uma ordem da Presidência para nos prender. Quando perguntamos por que estavam nos prendendo, eles responderam: ‘Vamos ver os motivos depois’”, contou Anabel.

Três horas depois da repressão, disse Pomar, o promotor Juan Manuel Esperante apareceu com um documento no qual acusava os manifestantes de “resistência à autoridade”. O mesmo promotor foi denunciado pelo Exaltación Salud há mais de um ano e meio por encaixotar denúncias de fumigação ilegal de agrotóxicos. Esperante, há quatro anos, ainda não investiga quem fumigou uma escola em Parada Robles no dia 11 de março de 2019.

Os vizinhos e vizinhas conseguiram uma medida cautelar que retira venenos de terrenos a mil metros. Quando esta disposição é violada, Exaltación Salud apresenta as denúncias criminais correspondentes. “O prefeito Diego Nanni, da Frente de Todos, se constituiu perante a Justiça para tentar derrubar aquela medida cautelar. O mesmo aconteceu com a Sociedade Rural local. Claro que os mil metros não impedem que os venenos cheguem à água, ao ar. Em todo caso, mil é melhor que nada, e assim manda a Justiça, gostem ou não. A Justiça voltou a concordar conosco, no dia 27 de dezembro, que não há condições de viver em ambientes saudáveis ​​e de usufruir do direito à saúde, dois direitos consagrados na Constituição. Na Exaltação eles não existem. Temos que arrecadar dinheiro, fazer rifas para ajudar a pagar tratamentos de câncer e leucemia. Coisas muito tristes”, comentou o jornalista.

Exaltación Salud há dez anos apresenta evidências dos danos causados ​​pelos agrotóxicos e exige o cumprimento dos direitos da população local. O Município tem mais de 60 mil hectares e, segundo Anabel, mais da metade deles estão cheios de agrotóxicos e transgênicos. “Temos bairros de 30 quarteirões com 50 casos de câncer. Pesticidas na água, no solo. Pesticidas dentro de nossos vizinhos e vizinhas. Estamos em uma situação de emergência socioambiental como o resto das cidades fumigadas em toda a Argentina. E não há rachadura política partidária nisso. O problema vem se aprofundando há 40 anos. A política não é dar respostas ao que acontece com as pessoas”, disse o membro do Exaltación Salud.

O jornalista se referiu à novíssima incorporação de Antonio Aracre, ex-CEO da empresa de sementes Syngenta, como principal assessor de Alberto Fernández: “A Syngenta é a maior corporação de agroquímicos do mundo. Politicamente, eles estão administrando esse modelo. Eles fazem isso em nome dos dólares, do progresso. O que dizemos antes disso é muito claro: a vida não se negocia, ela não tem preço. Não há atividade produtiva que possa estar acima da saúde e dos bens naturais comuns. Diante disso, resta apenas continuar exigindo que esse modelo não continue, a proibição total de agrotóxicos altamente perigosos. A única coisa que resta é seguir em frente. Porque a vida acabou aqui”, disse ele.

Exaltación Salud colocou em pauta o problema do território. Duas vizinhas, Patricia Benitez e Karina Miqueo, do bairro San José de Tala, em Los Cardales, tinham um terreno perto de casa. Um dia, eles começaram a sentir um cheiro estranho e viram seus bichinhos passarem mal. Eles começaram a ler e saber o que estava acontecendo e perceberam que o que estavam jogando fora eram agrotóxicos. “Foi maravilhoso duas pessoas da sociedade abordarem a Prefeitura e começarem a denunciar. O que Exaltación Salud busca é conseguir melhorias concretas e amplas para todo o Município. Mantemos conversas com os vizinhos para continuar a conscientização e divulgação. Este é o país mais pulverizado do mundo, temos esse triste recorde. São usados ​​139 pesticidas altamente perigosos, proibidos em muitas partes do mundo. No entanto, não existe uma lei nacional sobre o pedido. As empresas são cegamente acreditadas. Na Província existe uma lei obsoleta, que tem mais de 30 anos e é absolutamente permissiva. O que esses dois vizinhos propuseram é que fosse feita uma ordenança. Eles avançaram nisso, coletaram assinaturas e em 2012 saiu a primeira portaria, que ainda está em vigor. A Sociedade Rural escreveu, não tiraram o modelo dos vizinhos. Foram sete anos sem regulamentação. E a maioria dos políticos do Município votou contra. De todas as partes. Fomos à Justiça e conseguimos aquela medida cautelar judicial de proteção de mil metros de terreno e também uma portaria de interdição aérea”, afirmou.

Agroecologia, única saída

Anabel Pomar falou sobre a experiência de uma cooperativa de vizinhos, que também fazem parte do Exaltación Salud, e que propõem a agroecologia como forma de produção de alimentos: “Esses colegas formaram uma cooperativa agroecológica chamada Amaranto. Aproximam-nos dos alimentos saudáveis ​​que aqui comemos, bem como da alegria de saber que é possível outra forma de comer, sem venenos. No caminho da denúncia sempre, esses companheiros perceberam que a diferença também pode ser feita na alimentação”.

Nas redes de Exaltación Salud há uma petição online, onde pedem que sejam retiradas as acusações contra os detidos. “A prioridade é que os acusados, inclusive eu, fiquem livres dessas acusações mentirosas”, disse o jornalista.


Fonte: https://laretaguardia.com.ar/2023/02/tenemos-barrios-de-30-manzanas-con-50-casos-de-cancer.html

Source: https://argentina.indymedia.org/2023/02/04/tenemos-barrios-de-30-manzanas-con-50-casos-de-cancer/

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